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Ibama contraria ministério e mantém decisão de determinar que Belo Monte libere água no rio Xingu

Foto: Divulgação
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Com a decisão, empresa será obrigada a liberar 10.900 metros cúbicos de água por segundo já a partir de segunda-feira; segundo o governo, mudanças no partilhamento da água podem comprometer a retomada econômica do País

Pressionado de todos os lados pelo governo, o Ibama decidiu levar adiante a sua decisão técnica e determinou que a concessionária Norte Energia, dona de Belo Monte, execute a liberação máxima de vazão de água para o rio Xingu, entre os dias 1 e 7 de fevereiro.

Com a decisão, a empresa será obrigada a liberar, a partir de segunda-feira e durante uma semana, 10.900 metros cúbicos de água por segundo, conforme prevê o cronograma provisório estabelecido pelo Ibama. A Norte Energia e o Ministério de Minas e Energia (MME), que acionou toda a cúpula do governo para derrubar a decisão do órgão ambiental, queriam que essa vazão se limitasse a 1.600 m³ por segundo.

A reportagem apurou que a decisão já foi comunicada à concessionária e demais autoridades. No ofício emitido nesta tarde, ao qual o Estadão teve acesso, o presidente do Ibama, Eduardo Fortunato Bim, afirma que o tema continuará a ser discutido nos próximos dias.

“Registro que o Ibama está avaliando a necessidade de possíveis ajustes nas medidas de mitigação e compensação do empreendimento, considerando os elementos técnicos disponíveis no processo de licenciamento”, diz o presidente do Ibama, no documento. “As vazões a serem adotadas para os meses subsequentes do ano de 2021 serão objeto de deliberação por parte deste Instituto.”

Em situações normais, a vazão é decidida mensalmente, conforme cronograma prévio. A medida, portanto, é paliativa, enquanto não há uma decisão final.

A medida surpreende o próprio governo e representa uma derrota para a cúpula do setor elétrico do governo, que passou os últimos meses tentando derrubar as definições técnicas do órgão ambiental. Como o Estadão informou nesta sexta-feira, 29, o governo colocou até o Ministério da Economia para alegar que qualquer mudança na partilha das águas do Rio Xingu realizada pela hidrelétrica de Belo Monte poderá comprometer a retomada do crescimento econômico do País. A pasta chega a afirmar que as mudanças poderiam, inclusive, impor riscos à ordem pública.

Em ofício que o Ministério da Economia encaminhou na quinta-feira, 28, ao Ibama, a pasta afirmou que, “sem entrar em qualquer discussão jurídica ou de mérito ambiental que foge das atribuições desta Secretaria, e assumindo as consequências energéticas apresentadas pelo ministério setorial responsável (MME), a manutenção pelo Ibama do referido hidrograma pode atrapalhar a necessária retomada do crescimento econômico do país após crise sanitária sem precedente, importando riscos à ordem e à economia pública”, afirma o Ministério da Economia.

A pasta comandada por Paulo Guedes afirmou ainda que “com imensa probabilidade, implicará perda de competitividade e produtividade das empresas brasileiras e perda de renda das famílias. Cabe destacar, ainda, a hipótese de incremento na percepção do risco regulatório no país, deteriorando ambiente de investimentos em infraestrutura nacional”.

Na quinta, o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), André Pepitone, disse que espera uma decisão de “equilíbrio” sobre mudanças na quantidade de água que é liberada pela hidrelétrica de Belo Monte, no Pará.

Para André Pepitone, há “espaço para um meio termo” na decisão sobre liberação de água da hidrelétrica. Na quarta-feira, 27, a Aneel enviou um ofício ao Ibama, para comentar qual seria o custo financeiro para a tarifa do consumidor de energia, caso a Norte Energia siga as determinações do órgão ambiental em fevereiro, como já fez em janeiro. A reportagem teve acesso ao documento.

“Sem adentrar aos aspectos ambientais do assunto, o impacto estimado da medida aplicada nos dois primeiros meses de 2021, janeiro e fevereiro, seria próximo a R$ 1,3 bilhão para o consumidor final de energia elétrica”, declara o diretor-geral da agência, no ofício. “Respeitando as competências próprias dessa autarquia ambiental, é importante ressaltar que a nova vazão imposta traz impactos significativos ao setor elétrico brasileiro.”

O valor refere-se a uma estimativa de custo para aquisição de energia térmica, com o objetivo de repor aquela que deixaria de ser gerada no período. Esse valor seria transferido ao consumidor de energia, por meio da conta de luz.

A definição sobre o volume de água obedece a uma programação mensal, que varia fortemente conforme a época do ano, por causa dos meses de cheia e de seca. Neste mês de janeiro, por exemplo, a Norte Energia queria liberar apenas 1.100 metros cúbicos de água por segundo para a Volta Grande, conforme previsto em seu próprio hidrograma. O Ibama, porém, determinou que a concessionária fizesse a liberação de 3.100 m³/s.

Para fevereiro, a empresa pretendia liberar apenas 1.600 m³/s, mas o Ibama cobrou que esse volume chegue a 10.900 metros cúbicos, quase sete vezes o pretendido pela concessionária. Diversos estudos técnicos já demonstraram que a retenção da água tem comprometido espécies de peixes, ameaçando a fauna local. Comunidades ribeirinhas e indígenas correm riscos de terem que deixar a região, porque dependem diretamente do rio para sobreviver.

A Norte Energia apresentou duas propostas anuais de vazão, que passariam a ser usadas de forma alternada, durante o prazo de seis anos, para se chegar a um ajuste, os chamados hidrogramas A e B. Acontece que o Ibama, após análises, concluiu que é “impraticável a implantação do Hidrograma A”, e que, em relação ao Hidrograma B, “os dados presentes no processo de licenciamento são insuficientes para garantir que não haverá piora drástica nas condições ambientais e de modo de vida na Volta Grande do Xingu no caso de sua implantação”.

ESTADÃO – André Borges

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