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Garimpo ilegal avança 10 mil hectares na bacia do Xingu no Pará desde 2018, aponta instituto; liderança diz que indígenas sofrem prejuízo

Dados do garimpo ilegal na bacia do Xingu foram reunidos em um dossiê publicado pelo Instituto Socioambiental e Rede Xingu+. Dois municípios paraenses são responsáveis por 221% do crescimento da atividade ilegal.

Garimpo Coringa na Terra Indígena (TI) Baú. — Foto: Divulgação / Rede Xingu+
Garimpo Coringa na Terra Indígena (TI) Baú. — Foto: Divulgação / Rede Xingu+
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“Águas que parecem café com leite; crianças e mais velhos sofrendo com coceiras pelo corpo; água não dá para cozinhar, para beber”, é assim que o indígena Kayapó Mydje K Mekrangnoti descreve o Curuá, principal rio na Terra Indígena Baú, em Altamira, no Pará.

O território faz parte da bacia do Xingu que vive pressões em escalada causadas pelo garimpo ilegal. Segundo o dossiê “Garimpo: um mal que perdura no Xingu”, publicado pelo Instituto Socioambiental (ISA) e Rede Xingu+, o garimpo ilegal expandiu em 12,7 mil hectares a área de atuação. Desse total, 82% – cerca de 10 mil hectares – são em áreas de proteção.

O levantamento aponta ainda que na região do Xingu dois municípios paraenses são responsável pelo crescimento de 221% do garimpo na bacia entre 2012 e 2021: São Felix do Xingu  e Ourilândia do Norte.

A bacia do Xingu é uma área de 531.250 quilômetros quadrados — maior que o Maranhão — e segue o curso do rio Xingu, entre as regiões Centro-Oeste e Norte, passando pelo Pará e o Mato Grosso.

“O garimpo ilegal na região do Xingu ganhou força, resistindo às escassas operações de fiscalização e avançando para novas áreas. Foram quatro anos de derrubada de floresta, destruição de leitos de rio e contaminação de igarapés, além dos conflitos e impactos sociais causados pela invasão garimpeira nas terras indígenas e unidades de conservação”, aponta o levantamento, com dados do Sistema de Identificação Radar de Desmatamento (SIRAD X15), coletados entre 2018 e junho de 2023.

Só na TI Baú, onde vive Mydje, foram abertos seis novos focos de garimpo nos últimos cinco anos, além da reativação de lavras antigas. Em 2019, houve a retomada do garimpo Pista Velha e a abertura de outro foco às margens do rio Curuá, que é o principal curso d’água. Os dados do SIRAD X15 apontam que foram aproximadamente 100 hectares de floresta derrubada para o fim ilegal.

Depois disso, mais ações foram detectadas:

  • em 2020, mais três focos de garimpo nas margens do Curuá;
  • em 2021, dois garimpos, o Jurandi e o Coringa Sul, abertos no limite oeste da TI;
  • em 2022, houve nova tentativa de retomada dos garimpos Pista Velha e Pista Nova, mais ao centro da Terra Indígena; e balsas de garimpos fizeram no rio Curuá uma rota de entrada de garimpeiros para outras Terras Indígenas, como as TIs Xipaya e Kuruaya.

O dossiê indica prejuízos para além do desmate na região com o processo de separação do ouro de outros minérios, onde é utilizado o mercúrio – “metal de alta toxicidade que gera emissões tóxicas na atmosfera e rejeitos que contaminam o solo e a água”.

Segundo o estudo, “quando despejado em rios e lagos, o mercúrio passa por processo de metilação e se converte em forma mais tóxica, o metilmercúrio, sendo incorporado depois pela ictiofauna e outros animais aquáticos”. Os indígenas e ribeirinhos são grupo de risco, visto que peixe é a principal de alimentação dessas populações.

“O garimpo deixa uma carga muito grande de poluentes no nosso território, que vai desde os combustíveis usados pelas máquinas de extrair ouro, quanto o próprio mercúrio que eles usam para ganharem dinheiro. As máquinas causam uma devastação tremenda, nos rios e igarapés, interferem o curso da água, muitas vezes matando as nascentes”, explica Mydje.

O relatório atribui o aumento dos crimes ambientais às “escassas operações de fiscalização dos órgãos de comando e controle nas áreas protegidas, entre 2019 e 2022” e que, mesmo com a presença de mais operações, as áreas voltam a ser invadidas após a saída das equipes de fiscalização. “(…) constata-se a insuficiência de ações pontuais sem um plano de permanência dos órgãos de controle no território”, afirma.

Aldeia Kamaú, na Terra Indígena Baú. — Foto: Giovanni Bello / Rede Xingu +

Ainda segundo o estudo, a atuação garimpeira observada não se trata de extrações com poucos garimpeiros artesanais, mas sim “vastas áreas destruídas com uso de grandes maquinários e capitalizadas por uma rede criminosa, (…) com toda uma infraestrutura associada, como pistas clandestinas, estradas (…)”.

“Quando os garimpeiros abandonam, eles deixam muitos motores na terra indígena, ficam bombas, mangueiras, ferramentas e acampamentos cheios de lixo, roupas velhas, fogão, colchão, pilhas de lanterna e muito plástico originado de mercadorias, ou seja, o ambiente, que antes da chegada dos garimpeiros era sadio, se torna completamente degradado por uma atividade que enriquece poucas pessoas”.

Em nota, a Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do Pará informou que “vem intensificando ações de comando e controle no Estado”, e “que atua diariamente em localidades estratégicas para o combate às irregularidades ambientais”.

Ainda segundo a Semas, “mais de 50 garimpos ilegais já foram encerrados no estado” e que “um decreto de Emergência Ambiental fortaleceu o rigor no combate a ilícitos em 15 municípios identificados como críticos e instalou três bases fixas de atuação, uma delas em São Félix do Xingu”.

O g1 procurou também o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) e aguarda respostas. Há registro de algumas operações federais realizadas na região, como uma em junho de 2023 que desmobilizou quatro garimpos ilegais.

Fonte: G1

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