Importunação sexual é um crime que se caracteriza em qualquer ato libidinoso em relação a uma vítima específica, geralmente, em locais públicos, para satisfazer desejos sexuais do importunador. De acordo com a Secretaria de Estado de Segurança Pública e Defesa Social (Segup), o Pará registrou, em 2020, 676 casos de importunação sexual, de janeiro a setembro. Já em 2021, no mesmo período, foram registrados 704 casos. Em menos de duas semanas, dois casos ganharam repercussão: uma lutadora assediada em um ônibus e uma moça que foi submetida a filmes pornográficos e intimidação dentro de um carro de aplicativo.
Desde 2018, a lei nº 13.718/2018 criminaliza a ação. Antes, o agressor saía impune. Agora pode sofrer pena de um a cinco anos de reclusão. Sobre o aumento de casos, a Segup explica que o volume maior de ocorrências reflete uma maior conscientização da população em realizar denúncias.
“Em 2011, a lei ainda não era uma realidade. Eu estava no ônibus com uma amiga, indo para a aula, quando um cara se colocou atrás de mim e começou a fazer umas movimentações estranhas, esfregando sua genitália na minha bunda. Eu fiquei incomodada e sem reação. A minha amiga que estava ao meu lado que brigou com ele e ele mudou de lugar. Mas ficou por isso. Seguimos e fomos para aula. Hoje, 2021, mesmo com uma lei, isso continua sendo realidade”, disse uma jovem paraense, que preferiu não ser identificada, mas que está entre as tantas vítimas que esperam por uma realidade diferente no futuro.
Sabrina da Cunha, psicóloga da ParáPaz Mulher / DEAM Belém, afirma que as vítimas sofrem essas importunações de cunho sexual, em espaços públicos e até mesmo com grande movimentação. Geralmente, as vítimas têm entre 22 e 30 anos, mas isso pode acontecer com qualquer mulher em qualquer faixa etária. “As principais vítimas são as mulheres, que sofrem violações dos seus direitos. O assédio sexual é muito comum nos meios de transporte coletivo, assim como beijos forçados, passar com a mão no corpo alheio sem permissão”, explica.
“A escolha do importunador é em locais públicos para que não sofram nenhum ato punitivo, quando essa mulher não tem como comprovar. As vítimas sentem-se impotentes, envergonhadas no momento que acontece a importunação sexual, são vários sentimentos que emergem durante o assédio e após o acontecido as mulheres sentem medo, insegurança, culpa, em virtude de tudo que a sociedade impõe em relação ao machismo estruturado”, completa Sabrina.
Machismo, ressalta a psicóloga, é a raiz do problema. Traz prejuízos individuais e sociais para a mulher. Inclusive, é prejudicial à saúde mental de homens. “Na psicologia, o machismo se configura como excesso de valorização de atributos masculinos em detrimento da mulher, por isso precisa ser trabalhado com mudanças nas atitudes pessoais”, observa.
Sabrina reforça que o acolhimento é feito pelo órgão especializado integrado para que a mulher possa denunciar o ocorrido, fazer o boletim de ocorrência, ser encaminhada para outros setores ou profissionais responsáveis pelo o cuidar dessa mulher. “O setor de psicologia irá trabalhar os traumas existentes e sentimentos de culpa, insegurança, ansiedade, medo, depressão, baixa autoestima, entre outros. A Defensoria Pública faz um trabalho específico com esses homens, importunadores, através de palestras de conscientização, vídeos, entre outras atividades”, conclui.
Vítimas sempre devem denunciar casos, pois a subnotificação é incalculável
Ariane dos Santos Melo, delegada titular da Diretoria de Atendimento a Grupos Vulneráveis, orienta que as vítimas não deixem de denunciar, pois acredita que há muita subnotificação ainda. A vítima pode tentar reunir provas para esta denúncia, como filmar o agressor ou pegar o contato de possíveis testemunhas para auxiliar na investigação.
“É importante que essa vítima solicite ajuda de imediato. Seja de um agente de segurança pública em estádios, ou de alguma pessoa que esteja perto dela naquele momento. Sabemos que gera um abalo, mas é importante que se encaminhe a alguma delegacia. Solicite o apoio do 190, Polícia Militar, se aquele agente estiver no lugar. Ou pode ir em qualquer delegacia de bairro ou da Delegacia da Mulher. A partir da denúncia, o procedimento será realizado, o autor do crime será chamado para ser ouvido e será encaminhado para a justiça”, orienta a delegada.
Ariane ressalta que resguardar informações importantes é primordial para a solução do caso, se atentar ao ambiente que ocorre e colher informações com terceiros também. “Se o ato ocorreu no transporte coletivo, que ela veja a hora, a linha do ônibus, tente pegar o contato do motorista ou cobrador ou alguém que presenciou o assédio. Essas informações posteriormente vão ser importantes para localizar esse autor. Se essa mulher ou outra pessoa tiver como gravar – se tiver capacidade psicológica -, após isso é se dirigir a uma unidade policial para registrar ocorrência”, complementa.
“Quando a vítima denuncia, a gente consegue quantificar. A partir da quantificação das reclamações em torno de um determinado crime, conseguimos desenvolver políticas públicas, como é o caso dos estádios. Nós tivemos algumas reclamações, anseios dos próprios clubes. Nós tivemos recentemente dois casos em transportes, um em coletivo e outro em aplicativo. Eu acredito tanto como policial, quanto mulher, que essas mulheres acabam se encorajando para denunciar, por conta da notoriedade que nós estamos tendo em relação a essa demanda”, conclui.
Fonte: O Liberal