A Equatorial Energia, concessionária de energia elétrica no Pará, é investigada pelo Ministério Público Federal (MPF) por fornecer o serviço a invasores de terras indígenas na região do Médio Xingu.
O serviço prestado pela empresa estaria sendo feito sem autorização do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). O órgão encaminhou informações ao MPF em março deste ano relacionadas à terra indígena Ituna/Itatá, e o caso segue sendo investigado.
A área, de 142 mil hectares, é habitada por povos isolados do Igarapé Ipiaçava e fica nas áreas limítrofes dos municípios de Altamira e Senador José Porfírio.
Há dois registros de pedidos para exploração minerária na região: um de 1984, que teve liberação concedida para pesquisa; e outro, de 2017, que foi um requerimento de lavra garimpeira, ou seja, de extração do minério local.
A Coordenação das Organizações dos Indígenas Amazônia Brasileira (Coiab) emitiu duas cartas abertas sobre o caso em seu site. Na primeira, a entidade se direciona à Equatorial Energia.
“A existência de desmatamento e invasão no território não é novidade, mas a conivência por parte de uma empresa detentora de uma concessão estatal é chocante”, diz Angela Kaxuyana, representante da Coordenação, na carta.
Na segunda, a Coiab contextualiza que os ataques e as pressões sobre os territórios são crescentes em diversas regiões da Amazônia.
“Na TI Yanomami, por exemplo, a invasão ilegal descontrolada de mais de 20 mil garimpeiros ocasionou recentemente a morte de duas pessoas Moxihatëtëa. Em outras terras indígenas, temos mais cenários trágicos ocasionados pelas invasões ilegais em seus territórios”.
A nota também cobra investigação dessas invasões e a punição dos responsáveis:
“Sabemos que, nas cinco terras indígenas mais desmatadas (Munduruku, Apyterewa, Ituna-Itatá, Trincheira Bacajá e Cachoeira Seca) em 2020, há presença dos povos ‘isolados’ ou de ‘recente contato’. Em 2021, também foram registradas altas taxas de desmatamento nas TIs Piripkura e Uru Eu Wau Wau, áreas onde também vivem nossos parentes ‘isolados’. Por isso, cobramos que essas ilegalidades sejam investigadas, e os seus responsáveis punidos”.
Resposta da Equatorial
Por meio de nota, a Equatorial Energia informou que ao realizar uma obra do Programa Luz Para Todos, “devidamente licenciada pela Secretaria de Meio Ambiente Municipal, acabou por energizar oito unidades consumidoras que se encontram dentro da área que ainda está em processo de demarcação”. E acrescentam:
Desde que tomou conhecimento, porém, a Equatorial está em tratativas com Fundação Nacional do Índio (Funai) e Ibama para equacionar a questão na referida área, já que hoje existe uma portaria da Funai que impede o ingresso de terceiros em áreas indígenas, em função da pandemia de Covid-19”.
A empresa disse ainda que as unidades consumidoras da área, que está em processo de demarcação, foram notificadas de que serão desligadas e que aguarda a autorização de ingresso para a retirada de sua rede do local.
Ainda sobre a TI Ituna-Itatá, a Equatorial disse que solicitou autorização e licenciamento para Funai e Ibama para construção de 68 quilômetros de rede, conforme projeto aprovado e priorizado pelo Comitê Gestor do Programa Luz Para Todos, o qual é formado por autoridades estaduais, municipais e sociedade civil organizada. Segundo a Equatorial, os pedidos foram negados pelos órgãos, e o projeto foi abandonado.
“Vale ressaltar que, o projeto reprovado não incluía as oito unidades consumidoras referenciadas anteriormente, que estão a quilômetros de distância de onde seriam implantadas as redes não autorizadas”, diz a nota.
Atualmente, a concessionária de energia aguarda audiência administrativa junto ao Ibama para apresentar defesa diante dos autos de infração aplicados.
Equipe ameaçada na TI Apyterewá
Outra terra indígena que também possui ligações de energia elétrica em área ocupada irregularmente por grileiros é a Apyterewá.
De acordo com o site Terras Indígenas do Brasil, 729 pessoas vivem no local, que possui 773 mil hectares de extensão. Há riscos e problemas já registrados de exploração irregular de recursos por pescadores e garimpeiros, e problemas fundiários.
Até 2013, existiam quatro processos minerários na região, porém não há denúncias relacionadas a esta terra indígena no Ministério Público Federal.
Terra Indígena Apyterewá, localizada no município de São Félix do Xingu, também sofre ameaças de grileiros e ligações elétricas clandestinas por parte dos invasores — Foto: Reprodução
De acordo com a Equatorial Energia, as ligações existentes nesta TI, especificamente, são clandestinas e foram feitas de forma irregular por terceiros.
Ao tentar desligar as instalações, a pedido do Ibama, a concessionária informou que “não prosseguiu com as ações devido às ameaças sofridas pela equipe em uma região que é tradicionalmente de conflito”.
A empresa informou que possui tratativas com Ibama e Funai para conseguir autorização e apoio operacional e técnico para entrar na área e apoiar as autoridades no desligamento das ligações.
O g1 solicitou informações sobre os casos das terras Ituta-Itatá e Apyterewá junto ao Ibama e à Funai por meio de diversos canais de comunicação, mas não houve retorno sobre processos e tratativas junto à concessionária de energia e aos invasores das terras indígenas.
A reportagem também entrou em contato com a Prefeitura de São Félix do Xingu, cidade onde está localizada a TI Apyterewá, para saber se houve algum pedido de instalação de outros serviços por parte dos grileiros. A Prefeitura informou, por meio de aplicativo de mensagem, que verificaria a situação, mas não retornou ao nosso contato até o momento da publicação.
Fonte: G1 PA