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Sabores do Xingu e Transamazônica projetam turismo do Pará no mercado internacional

Empreendedores rurais investem em rota de cacau e chocolate associada ao turismo de eventos, natureza e aventura

Foto: Wilson Soares / A Voz do Xingu
Foto: Wilson Soares / A Voz do Xingu
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Texto e Fotos: Wilson Soares / A Voz do Xingu

Chocolatiers, empreendedores e gestores da região Transamazônica, no sudoeste do Pará, estão unindo esforços para conquistar o mercado mundial do turismo com produtos sustentáveis da região do Xingu.

A região da Transamazônica abrange 10 municípios e é responsável por cerca de 86% de toda a produção de cacau do Pará, o que posiciona o Estado como o principal produtor de amêndoas do Brasil. Além disso, a qualidade das amêndoas da região tem se destacado em concursos nacionais e internacionais, sendo reconhecidas como uma das melhores do mundo.

As deslumbrantes paisagens naturais proporcionadas pelo Rio Xingu também têm contribuído para o desenvolvimento do ecoturismo e do turismo de aventura na região.

Todo esse potencial tem despertado o interesse de pequenos empreendedores regionais, que buscam, por meio da tecnologia, novas alternativas para integrar a produção de cacau ao setor turístico, que atualmente figura como uma das principais fontes de emprego e renda no país.

Abelhas, cacau e chocolate artesanal com poder nutracêutico

Um exemplo inspirador nesse novo cenário é o empresário Antônio Pantoja, médico cardiologista com mais de três décadas de atuação na cidade de Altamira. Há 4 anos, ele e a esposa Kassandra Renê, que é odontóloga, decidiram investir em uma atividade que vem crescendo na região: a produção de chocolate artesanal fino. Esse sonho surgiu ainda na infância de Antônio, lá na ilha do Marajó, onde ele aprendeu com o pai o valor dos frutos de cacau nativo.

“Como meu pai tinha um lote e nós já plantávamos cacau no Marajó, quando apareceu a oportunidade de adquirir um lote pensei: vamos fazer como antigamente. Naquela época, a gente fazia nosso achocolatado no pilão. Não tinha liquidificador. Secávamos as amêndoas num tapete no trapiche. Era muito cacau. Isso tudo marcou a minha infância e fez a gente retomar essa prática de trabalhar com cacau”, comentou o produtor e médico, Antônio Pantoja.

O que começou como um hobby para o casal hoje se tornou um negócio de sucesso, que tem marca própria, a “Abelha Cacau”. De acordo com o empreendedor, hoje são produzidas cerca de 10 mil unidades de bombons por mês, além de uma série de produtos feitos a partir do fruto do cacau e do mel de abelha.

O cacau que serve de matéria-prima para a “Abelha Cacau” é plantado e colhido em um lote que Antônio detém no km 25 de Altamira, às margens da Rodovia Transamazônica, no trecho que dá acesso ao município de Brasil Novo/PA.

Após a colheita, 50% da produção passa por um processo de fermentação em cochos de madeira. Depois as amêndoas são encaminhadas para a fábrica e transformadas em chocolate fino. A produção artesanal acontece no município de Altamira, em uma Fábrica-Escola, onde além de renda, está sendo gerado conhecimentos. O empreendimento emprega 12 pessoas diretamente, além de outros colaboradores de forma indireta.

Em parceria com a Semagri (Secretaria Municipal de Agricultura de Altamira), é realizada no espaço formações para chocolatier. O curso tem duração de 15 dias, com carga horaria de 120 horas e já capacitou cerca de 70 pessoas, a maioria são produtores rurais da região, que aprendem a aproveitar todos os componentes do cacau, desde a casca da amêndoa até o nibs (fragmentos da amêndoa quebrada) e produzem uma variedade de pratos e subprodutos.

A altamirense Maria Inês participou da capacitação e aprovou. “Estou adorando o curso desde o início. Eu não sabia quase nada sobre o cacau, mas aqui a gente aprende desde como plantar, desenvolver e selecionar as amêndoas até como fabricar o chocolate, tudo de forma natural. Um trabalho muito lindo“, destacou a aluna.

O médico e produtor rural destaca que o chocolate com alto teor de cacau tem poder nutracêutico, ou seja, é um alimento medicinal para prevenção de doenças. A recomendação médica é o uso diário de pelo menos 20g.

“O cacau tem poderes medicinais muito grandes, desde antioxidantes, neurotransmissores, minerais e vitaminas. Todos esses nutrientes são importantes para prevenir várias doenças”, afirmou o médico.

Do chocolate ao turismo – Com a expansão do negócio “Abelha Cacau”, que atende clientes de todo o Brasil, o empreendedor Antônio Pantoja precisou adaptar sua infraestrutura, transformando a antiga residência em um hotel-pousada que permite aos visitantes uma visão privilegiada do majestoso Rio Xingu.

O local abriga também o bistrô museu & chocolate “Abelha Cacau”, que funciona de segunda a sábado, onde os clientes podem degustar chocolate quente e adquirir produtos saudáveis.

“O ambiente é muito agradável, a recepção foi maravilhosa e o que mais me chamou atenção na degustação foi o chocolate Iriri. A gente conhece um pouco desse rio e dos povos da floresta com os quais já trabalho. Gostei muito de conhecer o empreendimento”, destacou Nilda Ferreira, missionária do CIMI – Conselho Indigenista Missionário, que visitou pela primeira vez o espaço, que também serve para a realização de eventos.

Os empreendedores Kakao Blumenn de Brasil Novo

Dona Verônica Preuss e seu José Renato são catarinenses, mas desde o ano 2000 foram morar no município de Brasil Novo, na Transamazônica, mais precisamente no Travessão da 20, a cerca de 6 km da faixa da rodovia federal, onde o casal começou a plantar cacau.

Em 2015, vislumbrando novas oportunidades, Verônica resolveu deixar a profissão de professora na cidade de Brasil Novo para se dedicar mais à produção de cacau em sua propriedade. Em 2019, ela iniciou na profissão de chocolatier e a partir de então, o casal passou a separar 15% da produção de cacau e transformar as amêndoas em barras de chocolate.

Em 2021, Verônica Preuss percebeu que poderia se aprimorar mais ainda para atender as novas exigências do mercado e lançou na região a marca “Kakao Blumenn”. A palavra que deu nome à marca significa flores, no idioma alemão, origem ancestral de Verônica e do esposo.

Hoje, a pequena fábrica produz 16 diferentes sabores de chocolates, com teores variados de cacau, que vão de 50% a 100%. Além disso, oferece outras delícias que são combinadas com sabores regionais, como o chocolate 52% com açaí e 60% com café, além de outras opções que alcançam mercados consumidores distintos e a cada dia vem ganhando o paladar de novos clientes.

Quase todas as semanas, o casal de cacauicultores recebe grupos de visitantes interessados em fazer uma imersão na cadeia produtiva do cacau. E esse interesse, que inclusive vem de autoridades, não é por acaso. No sítio está uma das melhores amêndoas de cacau do Brasil, com o terceiro lugar, em uma premiação realizada na Bahia, em 2021.

Dona Verônica também trouxe para a Transamazônica um reconhecimento importante após participar de um concurso nacional. Ela foi a vencedora do Prêmio Sebrae Mulher de Negócios 2022, na categoria Produtora Rural, no Pará, e ficou em segundo lugar no ranking nacional. Além do troféu e da medalha de prata, Verônica também foi agraciada com consultorias oferecidas pelo Sebrae para ajudar a fortalecer e organizar o negócio.

“Os clientes que o Sebrae apoia com cacau e derivados, principalmente os que atuam com a fabricação de chocolate na região da Transamazônica, são capacitados no desenvolvimento dos negócios, para que possam estar prontos para receber os visitantes.  Trabalhamos a gestão financeira que eles têm e como podem agregar valor com atividade turística”, frisou Márcia Carneiro, analista técnica do Sebrae – Agência Xingu, que também destacou que o Sebrae hoje presta assessoria na área do turismo regional para as categorias de mobilidade, hospedagem, economia criativa e alimentação fora do lar.

Foto: Wilson Soares

Verônica nos conta que desde 2020 tem procurado se capacitar cada vez mais sobre a produção de chocolate e os diferentes sabores criados pela chocolatier já não conseguem atender a demanda pelo produto artesanal, que cresceu a ponto de toda a produção ser comercializada.

“Nesse universo de chocolates, trabalhamos embalagem, design e receitas. O esforço valeu a pena e hoje temos um produto delicioso, saudável e sustentável”, comemora a chocolatier, que aproveitou para convidar as pessoas a conhecer a região. “A Transamazônica tem o melhor chocolate do mundo.  Então venham conhecer e degustar esses sabores”, concluiu a chocolatier Verônica.

Rota “Cacau ao Chocolate” – Associada à crescente produção e ao surgimento de novos empreendimentos na cadeia produtiva do cacau e chocolate no Xingu e Transamazônica, a Prefeitura de Altamira lançou no final do ano passado a “Rota Turística do Cacau ao Chocolate”, que abrange cinco municípios ao longo da Rodovia Transamazônica (BR-230).

A rota proporciona aos turistas, em uma extensão de aproximadamente 500 km, a oportunidade de explorar oito empreendimentos distintos, focados na produção e cacau e chocolate, mas também aliando essa produção ao turismo de natureza, gastronomia, aventura, entre outros segmentos. 

Os empreendimentos da rota são o Santa Amazônia, localizada em Anapu; Abelha Cacau, em Altamira; Cacau Xingu e Kakao Blumenn, em Brasil Novo; Cacauway, Ascurra Chocolate e Sabor e Arte do Cacau, em Medicilândia e a Fazenda Panorama, em Uruará.

Além de poder conhecer e adquirir produtos diretamente nas fábricas artesanais, os visitantes têm a chance, em algumas dessas instalações, de acompanhar todo o processo, desde a colheita do cacau até a fermentação das amêndoas.

A rota turística já foi oficialmente lançada em Altamira, Belém e na Feira Internacional de Turismo de Gramado, no Rio Grande do Sul. E a secretaria de turismo do município continua divulgando a nova opção nos grandes eventos que acontecem em todo o país.

“Eu fico muito feliz em ver que o chocolate ainda é artesanal. É um processo feito com muito zêlo, com muito amor, permanecendo a cultura do chocolate com seu verdadeiro sabor”, disse a turista Carla Morgana Denardin, que em março integrou o primeiro grupo de convidados para conhecer a rota e ficou surpresa com a produção regional.

Edgar Soares de Matos, natural de Três de Maio, no Rio Grande do Sul, também fez parte do primeiro grupo de visitação. Ele conta como foi a primeira experiência em uma lavoura cacaueira. “Já fui em muitas plantações de café e outras, mas de cacau é a primeira vez que eu faço esse roteiro. Achei incrível essa rota do cacau, desde a plantação, todo o cultivo, escutar também da pessoa que coordena esse espaço e é proprietária, que o cacau não é somente a amêndoa, mas também tem outros produtos que você aproveita”, relatou.

Impacto na gastronomia e hotelaria – O crescimento do turismo na Região do Xingu também já reflete em outras atividades econômicas, como as churrascarias e hotéis, que buscam a consultoria do Sebrae para inovação e manutenção da competitividade no mercado. Um exemplo é o empresário altamirense Deivison Sousa, proprietário de uma das churrascarias mais antigas e tradicionais da cidade.

O olhar visionário do jovem empreendedor que também trabalha nos ramos de hotelaria e eventos o levou a criar um espaço turístico na entrada de seu estabelecimento, para que os clientes possam tirar fotos com o nome da cidade. “Este ano, criamos um letreiro “instagramável” com o nome da nossa cidade e um coração, para demonstrar o nosso carinho e amor que temos por Altamira” disse Deivison 

Além disso, Deivison tem buscado incluir no cardápio de sua churrascaria uma culinária que contempla os produtos regionais.

“Fazemos questão de valorizar os produtos da região, através da revenda de chocolate, do biscoito de castanha-do-Pará, de camisas personalizadas com imagens tanto do cacau quanto do tucunaré. Acreditamos que o turismo é sim uma fonte de renda favorável para nossa região”, concluiu o empreendedor.

CHOCOLAT XINGU – No mês de junho é realizado, em Altamira, o Festival Internacional do Chocolate e Cacau, considerado o maior da América Latina. O evento ocorre no Centro de Eventos da cidade e atrai empreendedores não apenas de outras cidades brasileiras, mas também chef´s de cozinha, palestrantes e jornalistas do exterior.

De acordo com dados da prefeitura local, a última edição do festival, realizada em junho de 2023, reuniu mais de 120 mil visitantes ao longo das quatro noites de feira e movimentou cerca de 5 milhões de reais em negócios, só em Altamira. A feira é vista tanto pelos empreendedores quanto pela organização como uma grande vitrine para apresentar os produtos regionais ao restante do mundo. Este ano, o festival do chocolate será realizado entre os dias 13 e 16 de junho”.

“Tudo isso para que Altamira possa mostrar o seu potencial. Se você está interessado em investir, nós temos áreas agricultáveis. Preservamos a natureza. Nós temos três rios maravilhosos: o Xingu, Iriri e Curuá. Água em abundância e um povo trabalhador e acolhedor”, ressaltou o prefeito de Altamira, Claudomiro Gomes.

O cacau do Pará – Vale destacar que o Pará, enquanto maior produtor de cacau no Brasil, é responsável por quase 150 mil toneladas por ano, em uma cadeia que envolve 32 mil produtores.

Neste contexto, o Governo do Pará, aliado à iniciativa privada e sociedade civil organizada, tem investido para colocar essa produção no mercado exterior, aprimorando tecnologia, estruturas de acesso, logística de exportação.

Os principais órgãos/entidades envolvidos são a Secretaria de Desenvolvimento Agropecuário e da Pesca (Sedap), a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac), o Fundo de Desenvolvimento da Cacauicultura do Pará (Funcacau) e o Programa de Desenvolvimento da Cadeia Produtiva da Cacauicultura no Pará (Procacau). E, ainda, no campo da pesquisa, atuam a Ceplac e Embrapa, que fazem a pesquisa, a Emater e o Senar (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), que fazem a assistência técnica, apoiadas pelo Funcacau.

Venha – Quem desejar conhecer a região do Xingu e seus atrativos turísticos deverá buscar informações sobre a melhor época de visitação, antes de fazer o agendamento. Essas orientações podem ser obtidas junto às secretarias de turismo dos municípios inseridos na rota do cacau ao chocolate.

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