De acordo com uma estimativa da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), dez mil pessoas cometem suicídio por ano em todo o Brasil. Esse cenário instigou o Conselho Federal de Medicina (CFM) a tornar o assunto uma prioridade da Câmara Técnica de Psiquiatria e, a partir de iniciativas como a cartilha “Suicídio: informando para prevenir”, alertar para os riscos do que é chamado de epidemia silenciosa e ainda o que se pode fazer para ajudar quem se encontra em uma situação de total desesperança.
Luiza Montenegro, voluntária do Centro de Valorização da Vida (CVV) em Belém há dez anos, cita o Grupo de Apoio aos Sobreviventes do Suicídio (GASS) e o Caminho da Renovação Contínua (CRC) como duas vertentes da entidade que oferecem apoio a quem precisa em horas tão difíceis. É importante ficar atento aos sinais que, por vezes, passam despercebidos, às vezes em quem parece estar longe de estar enfrentando qualquer tipo de sofrimento.
“A mudança de comportamento, em especial quando acontece de forma mais brusca, quando alguém que era mais extrovertido passa a se retrair, se isolar, se despedir das pessoas, é um sinal. E o contrário também, que muitas vezes não é identificado da forma correta, quando alguém que é mais introspectivo, mais solitário passa a exagerar em festa, bebida. Podem achar que é melhora, mas também pode ser um ato de desespero, de fuga”, afirma.
Situações em que a pessoa deixa de lado hobbies, compromissos e necessidades básicas, como tomar banho e se alimentar, também acendem o alerta. Período festivos tendem a deixar mais sensíveis quem enfrenta um momento difícil. Então Natal, Ano Novo, Dia das Mães ou dos Pais, aniversários de pessoas queridas que se foram acabam instigando reflexões acerca de planos não concretizados, coisas que potencializam o sentimento de tristeza intensa.
“O ápice não surge de um momento para o outro, são sentimentos que vamos guardando e não colocando pra fora, como se fosse mesmo uma panela de pressão”, analisa Luiza. Além dos grupos de apoio, o CVV conta com o serviço 188, por telefone, gratuito e sigiloso.
Apesar da gravidade desse cenário, ainda é comum o desrespeito ao paciente em sofrimento, que ela atribui à falta de informações. “Por isso há campanhas como o Setembro Amarelo e Janeiro Branco para contribuir a essa discussão. Quem está muito fragilizado e encontra um ambiente de incompreensão pode ter o caso agravado”, atenta. “O acolhimento sem julgamento é um dos pilares desse processo de ajuda e tratamento”, reforça.
Psiquiatria
Presidente da Associação Paraense de Psiquiatria, o médico psiquiatra Kleber Roberto da Silva Gonçalves de Oliveira, que integra o quadro do HC, cita uma combinação de sete letras e significados que podem fazer a diferença na hora de identificar quem pode estar precisando de ajuda e às vezes nem sabe. Desânimo, desesperança, desamparo e desespero; e intolerável, inescapável e interminável são os quatro “D” e os três “I” que compõem um quadro que faz com que a pessoa em estado de sofrimento veja tudo a partir de uma perspectiva negativa.
Uma prática que vem chamando a atenção da categoria são as automutilações, em especial entre os mais jovens. “Já é um sinal de que tem algo errado, não deixa de ser um pedido de ajuda”, atenta o psiquiatra. “O suicídio é algo muito complexo por ser multifator. Por isso a importância da avaliação feita por um médico psiquiatra e uma equipe especializada em saúde mental. Eu digo que já convidamos muito a falar sobre o assunto, agora é hora de fazer algo a respeito. O estigma é real e é preciso saber diferenciar a tristeza da depressão, da dependência química”, diz. “Ninguém fica triste porque quer”, esclarece.
Por fim, Kleber destaca a importância dos fatores de proteção que podem ajudar no tratamento, que vão desde o suporte familiar presente aos serviços básicos, para além da emergência em um momento de crise ou surto. “Quando há a melhora, o paciente precisa continuar o atendimento na Unidade Básica de Saúde, nos (Centros de Atenção Psicossocial) CAPS, que estão precários, sem médicos. O Brasil, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), é o país dos ansiosos, dos deprimidos. Precisamos do fortalecimento dessa rede o quanto antes”, alerta. (com Redação).
Cartilha: Mitos e verdades do comportamento suicida
Mito – O suicídio é uma decisão individual, já que cada um tem pleno direito a exercitar o seu livre arbítrio.
Verdade – Os suicidas estão passando quase invariavelmente por uma doença mental que altera, de forma radical, a sua percepção da realidade e interfere em seu livre arbítrio. O tratamento eficaz da doença mental é o pilar mais importante da prevenção do suicídio.
Mito – Quando uma pessoa pensa em se suicidar terá risco de suicídio para o resto da vida.
Verdade – O risco de suicídio pode ser eficazmente tratado e, após isso, a pessoa não estará mais em risco.
Mito – As pessoas que ameaçam se matar não farão isso, querem apenas chamar a atenção.
Verdade – A maioria dos suicidas fala ou dá sinais sobre suas ideias de morte. Boa parte dos suicidas expressou, em dias ou semanas anteriores, frequentemente aos profissionais de saúde, seu desejo de se matar.
Mito – Se uma pessoa que se sentia deprimida e pensava em suicidar-se, em um momento seguinte passa a se sentir melhor, normalmente significa que o problema já passou.
Verdade – Se alguém que pensava em suicidar-se e, de repente, parece tranquilo, aliviado, não significa que o problema já passou. Uma pessoa que decidiu suicidar-se pode sentir-se “melhor” ou sentir-se aliviado simplesmente por ter tomado a decisão de se matar.
Mito – Quando um indivíduo mostra sinais de melhora ou sobrevive a uma tentativa de suicídio, está fora de perigo.
Verdade – Um dos períodos mais perigosos é quando se está melhorando da crise que motivou a tentativa, ou quando a pessoa ainda está no hospital, na sequência de uma tentativa. A semana que se segue à alta do hospital é um período durante o qual a pessoa está particularmente fragilizada. Como um preditor do comportamento futuro é o comportamento passado, a pessoa muitas vezes continua em alto risco.
Apoio
CVV GASS – Grupo de Apoio aos Sobreviventes do Suicídio (para parentes e amigos de vítimas e sobreviventes de tentativas)
Dia: 3ª quinta-feira de cada mês
Local: Tv. Castelo Branco, 870 (Espaço 3) – Belém/PA
Hora: 15h30 às 17h30
Informações: (91) 98525-4082 ou [email protected]
Caminho da Renovação Continua – O grupo de autoconhecimento do CVV Belém
Dia: 10 e 24 de setembro
Local: Tv. Castelo Branco, 870 (Espaço 3) – Belém/PA
Hora: 15h30 às 17h30
Informações: (91) 98525-4082 ou [email protected]
Fonte: DOL