A Secretaria de Segurança e Defesa Social (Segup) registrou, de janeiro a agosto deste ano, 3.219 delitos em ambientes virtuais, um aumento de 30% em relação ao mesmo período do ano passado, quando foram computados 2.461 delitos. Entre os principais golpes cometidos estão o estelionato, furto, falsa identidade e falsidade ideológica.
Com o advento da pandemia, há cerca de 1 ano e meio, muitas pessoas foram obrigadas a cumprir o isolamento social e, por consequência, tiveram de trabalhar remotamente. Dessa forma ficaram mais expostas a golpes virtuais, já que aumentaram ainda mais o uso dos meios digitais (computador e smartphone) para compras e transações bancárias, por exemplo.
Flávia Figueira Secco, advogada especialista em Proteção de Dados e Privacidade, lembra que ao trabalhar no ambiente corporativo de uma empresa a pessoa tem ao seu favor um sistema de segurança muito mais avançado. “Trabalhando em casa essa vulnerabilidade aumenta muito em razão do sistema de proteção ser doméstico, muitas vezes inadequado. Foi por essa razão que muitas empresas passaram a sofrer ataques virtuais através das redes e equipamentos domésticos de seus funcionários”, detalha.
Ela diz que os criminosos vão aprimorando a sua atuação com o desenvolvimento da tecnologia. “Os golpes vêm sendo cada vez mais aperfeiçoados e continuam enganando até mesmo pessoas mais experientes e preparadas”, diz.
Ela cita um exemplo pessoal: no início deste ano uma suposta emissora de TV entrou em contato com a advogada para realizar uma entrevista virtual ao vivo. Ela conversou com o suposto representante da emissora que, ao final da conversa, afirmou que enviaria uma senha para que ela colocasse na plataforma de entrevistas para poderem registrar seu acesso.
“Na verdade, se eu fizesse o que eles estavam pedindo eu perderia meu acesso ao WhatsApp e passaria para eles. O WhatsApp não é clonado, ele apenas sai de um lugar e vai para outro com a permissão do usuário que é enganado. Com o acesso ele começa a passar mensagens para os contatos do usuário titular para pedir dinheiro e outras coisas”.
As fraudes também atingiram muitas pessoas que foram beneficiadas por programas de auxílio de renda do governo, antecipação de benefícios e que fazem empréstimos consignados, a maioria idosos. Nesse cenário, a maioria dos beneficiados são famílias pertencentes às classes “C” e “D”, com uma baixa escolaridade e muito mais suscetíveis a esse tipo de crime por dificuldades financeiras.
“Na ânsia de receber os benefícios, as pessoas acabam fazendo tudo que os criminosos pedem e acabam perdendo tudo. E os fraudadores muitas vezes acabam recebendo ajuda de funcionários de dentro dos próprios órgãos para praticarem as fraudes”, diz Flávia.
Um dos golpes mais aplicados é o chamado “phishing” no qual a vítima recebe links falsos em suas redes sociais e via e-mail. “A pessoa que clica acaba repassando todos seus dados e informações achando que o site para onde é redirecionado é o real. Isso ocorreu muito com os streamings onde a vítima recebe supostas promoções com preços muito abaixo dos praticados pelas plataformas”, diz.
A advogada cita que vem crescendo nos últimos meses o roubo de celulares não pelo valor ou modelo do aparelho, mas pelos dados que nele estão armazenados, como as contas PIX, contas bancárias e outras senhas e informações importantes. “Muitas vezes as pessoas mantêm arquivos em e-mails ou em aplicativos onde coloca todas as suas senhas, e isso é um perigo”, alerta.
Outro golpe muito comum é o do “bilhete premiado” onde a vítima recebe avisos em suas redes sociais e nas caixas de e-mail avisando que ganhou determinada premiação.
“Uma conhecida fazia procedimentos estéticos numa clínica e recebeu uma mensagem dessa clínica oferecendo um pacote de procedimentos pela metade do preço. Como se tratava do número da clínica que estava acostumada, aceitou o pacote, fez o pagamento e no dia do procedimento descobriu que um criminoso havia conseguido acessar a conta da clínica e feito a fraude. Desconfie sempre de promoções que pedem confirmação quase imediata para o recebimento do benefício”.
Alguns dos golpes virtuais que mais atingem os usuários
Phishing – Encaminhamento de links falsos com aparência de verdadeiros através de e-mails e redes sociais para a coleta de dados pessoais por criminosos
Cartão de crédito – Utilização de dados salvos e capturados por criminosos ou mesmo de sites que não existem, e que oferecem valores abaixo do mercado, fazendo com que a vítima compre e nunca receba o que solicitou.
Promoções falsas – A vítima recebe links ou imagens por e-mail onde o criminoso pede que clique em cima para fazer um pagamento para ter acesso à promoção, que não existe. O golpe ocorre muitas vezes em empresas que a vítima já conhece ou já usou o serviço e que também caem no golpe.
SMS e WhatsApp- É necessário muito cuidado ao abrir toda e qualquer tipo de informação por mensagens e pelo WhatsApp: cuidado em especial quando estiver em grupos. Outro cuidado importante: toda cautela a pedidos de senha encaminhadas por SMS. Via de regra essa solicitação é para retirar o acesso do WhatsApp.
Ajuda financeira – Ainda que o pedido venha de pessoas conhecidas e muito próximas, desconfie sempre. Ligue para quem está pedindo para confirmar a informação e forneça dados peculiares para que a pessoa possa confirmar.
PIX – É importante sempre checar se os dados informados são mesmo da pessoa. Caso esteja diante de valores mais elevados, dê preferência ao TED e ao DOC, que contém mais informações do titular da conta, ainda que o Banco Central garanta o rastreamento das transações.
Senhas – Sempre utilizar vários grupos de senha, pois caso haja o hackeamento de um grupo, não afetará de imediato os outros grupos.
Créditos financeiros – Buscar sempre financeiras reconhecidas e credenciadas e jamais realizar tais transações por mensagens de celular. Dê preferência em sempre ir ao local da empresa.
Usuários relatam tentativas de golpes
A família da professora A.C.F sofreu duas tentativas de golpes. Uma delas ocorreu na última terça-feira quando uma pessoa fez um “print” da foto do perfil da rede social Instagram do seu marido, que praticamente não usava a conta, mas que mantinha o perfil aberto. “Com a foto dele essa pessoa passou uma mensagem para os contatos do WhatsApp do meu marido afirmando que havia mudado de número e pedindo que as pessoas salvassem o novo contato”, diz.
Após passar a mensagem, o impostor começou a pedir dinheiro para os contatos do marido de A. Ocorre que os pedidos foram repassados para pessoas muito próximas, incluindo parentes, como mãe e irmão.
“Quando percebi que a foto usada no perfil falso era do Instagram, acessei a conta do meu marido para excluí-la e assim que fiz a primeira tentativa a rede social mandou uma mensagem avisando que a senha utilizada na conta estava em risco e que não era mais segura. Imediatamente mudei a senha e excluí a conta”, diz.
Numa outra ocasião, o casal estava visitando uma obra e, ao entrar no elevador, o sinal do celular do marido de A. ficou sem sinal. “Achamos que era por causa do elevador. Mas assim que saímos de dentro o celular continuou sem sinal e achamos o fato estranho. Aí meu marido pegou o meu telefone e ligou para o dele. O telefone chamou, mas ele percebeu que o aparelho que estava na mão dele tocou”, detalha.
O marido descobriu que alguém havia tentado fraudar o dispositivo de segurança de “2 etapas” do WhatsApp, criado para prevenir invasão ao dispositivo. “Corremos para a operadora e chegando na loja descobrimos que uma pessoa havia se passado pelo meu marido e solicitado um novo chip para habilitar um novo número, o que meu marido nunca fez. O objetivo era invadir a sua conta e acessar seus contatos para realizar fraudes, que felizmente não ocorreu porque conseguimos ser mais rápidos”.
O representante comercial Cláudio José Marques também foi vítima de uma tentativa de golpe virtual. Um dia depois de fazer uma reserva num hotel de grande porte em Jericoacoara (CE), recebeu uma mensagem de texto afirmando que havia sido premiado com uma “reserva bônus” de 2 diárias no hotel. Para receber o benefício, ele teria que clicar num voucher que constava na mensagem e pagar um valor para poder acessar o prêmio.
“Na mesma hora percebi que era um golpe dada a dificuldade de conseguir uma reserva nesse hotel e o preço da diária. Imediatamente deletei a mensagem e entrei em contato com o hotel que informou não ter enviado qualquer mensagem para mim. O que eles enviaram foi um outro e-mail, padrão, de confirmação de reserva sem qualquer link ou voucher, o que é um procedimento normal. As pessoas precisam ter muito cuidado para não cair nesse tipo de cilada”, diz.
Fonte: DOL