A Justiça Federal decidiu, na última sexta (13), suspender instrução normativa da Fundação Nacional do Índio (Funai) no Pará, que permitia o registro de propriedades privadas sobrepostas a terras indígenas ainda não homologadas pelo governo brasileiro.
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), a sentença confirma decisão liminar de janeiro deste ano e declara nula a instrução normativa. O G1 solicitou nota da Funai, mas ainda aguardava resposta até a última atualização da reportagem.
O MPF demonstrou que, ao retirar dos sistemas de gestão fundiária (Sigef) e de cadastro ambiental rural (Sicar) terras indígenas cujos processos de demarcação ainda não foram concluídos, na prática a “portaria liberava a grilagem de áreas e poderia intensificar conflitos agrários”.
Com a sentença, todas as terras indígenas na região abrangida pela subseção judiciária de Tucuruí devem ser incluídas ou mantidas nos sistemas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), independentemente da etapa do processo de demarcação. A região abrange os municípios de Breu Branco, Goianésia do Pará, Jacundá, Novo Repartimento, Pacajá, e Tailândia, além de Tucuruí.
Segundo a decisão, terras reivindicadas formalmente por grupos indígenas, em fase de estudo e identificação, delimitadas, declaradas e com portarias de restrição de uso agora terão que voltar aos cadastros e ficam proibidos os cadastros sobrepostos de particulares.
Na sentença, a Justiça Federal registra que, ao excluir as áreas não homologadas, a Funai contraria as normas constitucionais que tratam da matéria, “em especial o parágrafo 6º do artigo 231 da Constituição de 1988, fixando proteção jurídica inferior àquela conferida pelo constituinte, na medida em que possibilita a precedência e a sobreposição de títulos privados em territórios indígenas, o que pode dificultar sobremaneira a tramitação dos processos demarcatórios”.
Entenda o caso
Ao todo, procuradores da República ajuizaram 28 ações judiciais na primeira instância da Justiça Federal, pedindo a suspensão da instrução normativa 09/2020, com 19 decisões judiciais favoráveis. Atualmente, a norma da Funai está suspensa por ordens judiciais em oito estados da federação: Pará, Mato Grosso, Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia, Bahia e Rio Grande do Sul, o que garante a proteção de mais da metade das terras indígenas brasileiras.
Em recursos à segunda instância, o governo federal até agora conseguiu reverter três liminares em Mato Grosso do Sul e suspender duas, em Santa Catarina e no Ceará.
Duas liminares foram negadas, nas subseções judiciárias de Dourados (MS) e Foz do Iguaçu (PR) e o MPF aguarda decisão sobre recursos nesses dois casos.
Das 28 ações civis públicas ajuizadas sobre o tema em todo o país, seis ainda estão pendentes de apreciação, em Belém (PA), São Luís (MA), Carazinho (RS), Vilhena e Ji-Paraná (RO) e São Paulo (SP). Cinco das liminares deferidas já foram confirmadas por sentenças, em Santarém (PA), Tucuruí (PA), Castanhal (PA), Rio Branco (AC) e Boa Vista (RR). Em uma das ações judiciais iniciadas pelo MPF, em Belo Horizonte (MG), houve declínio de competência.
O MPF sustenta nas ações judiciais que a instrução normativa “contraria o caráter originário do direito dos indígenas às suas terras e a natureza declaratória do ato de demarcação; cria indevida precedência da propriedade privada sobre as terras indígenas, em flagrante ofensa à Constituição; representa indevido retrocesso na proteção socioambiental; incentiva a grilagem de terras e os conflitos fundiários; entre outros problemas”.
As decisões judiciais obtidas determinam a manutenção das áreas indígenas ainda não homogologadas no Sigef e no Sistema do Cadastro Ambiental Rural Sicar.
Fonte: G1 Pará