Operação realizada na semana passada em Senador José Porfírio, no sudoeste do Pará, resgatou cinco trabalhadores por suposta submissão a condições semelhantes às da escravidão. Entre eles, uma era menor de idade, com 14 anos. A equipe de fiscalização encontrou, ainda, uma criança de um ano e quatro meses, filha de uma das trabalhadoras resgatadas.
O grupo de fiscalização móvel foi composto pelo Ministério do Trabalho Emprego (coordenador), pelo Ministério Público Federal (MPF), pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), pela Polícia Federal (PF) e pela Defensoria Pública da União (DPU).
O grupo de trabalhadores resgatados foi localizado em uma fazenda próxima ao rio Bacajá, que é o limite entre os municípios de Senador José Porfírio e Anapu. O grupo estava alojado em dois barracos cobertos por lona plástica e palha, construídos por eles mesmos na mata perto de uma nascente. Não havia banheiros.
Dentre os trabalhadores, três eram homens adultos, tendo um deles permanecido nove meses ininterruptos no local; uma mulher adulta e sua sobrinha adolescente, com 14 anos, cozinhavam para o grupo, em um fogão feito de taipa.
Servidão também por dívidas – Além das condições degradantes flagradas na operação, a equipe de fiscalização constatou também que os trabalhadores foram submetidos à servidão por dívidas, já que seus salários não eram pagos pelo empregador e, ainda, sua saída do local não era permitida até que supostas dívidas fossem quitadas. “Daqui só sai pagando ou carregado”, teria declarado o empregador.
Após ser notificado, o fazendeiro quitou as verbas trabalhistas e rescisórias devidas. Houve, ainda, celebração de Termo de Ajustamento de Conduta com a Defensoria Pública da União e o Ministério Público do Trabalho.
As assistências sociais dos municípios em que residem os trabalhadores foram comunicadas e se encarregarão de seu acolhimento.
Apuração criminal – A apuração criminal está sendo realizada por meio de procedimento investigatório criminal (PIC), sob a presidência do Ministério Público Federal. Serão levados em consideração os elementos colhidos no local, as declarações das vítimas e dos investigados e a recomposição dos danos e outros elementos a serem colhidos.
Será apurado se a conduta dos investigados representou o crime de redução das vítimas a condição análoga à de escravo, previsto no artigo 149 do Código Penal, podendo as penas chegarem a oito anos de reclusão em relação a cada vítima, além de serem aumentadas na metade quando o crime é cometido contra criança ou adolescente.
Medida cautelar – Na última segunda-feira (17), o MPF conseguiu decisão favorável na Justiça Federal que proibiu os dois investigados pelo crime de submissão a trabalho escravo de se aproximarem das supostas vítimas, incluindo a menor de idade e a bebê.
Os empregadores teriam, antes da fiscalização, tentado convencer as vítimas a não colaborarem com as autoridades federais e a destruírem estruturas para evitar colheita de provas.
Além disso, foi relatada ao Ministério Público Federal tentativa de intimidação. Os investigados teriam ficado rondando a casa de parentes da vítima, registrou o Ministério Público.
Outras áreas fiscalizadas – O grupo de fiscalização móvel ainda fiscalizou outras três propriedades rurais no município de Medicilândia, também no sudoeste paraense. Não foram realizados resgates nem encontradas situações que pudessem caracterizar possíveis crimes contra trabalhadores nas fiscalizações no município.
Dificuldades no deslocamento – Para chegarem aos locais, o grupo de fiscalização móvel transpôs diversas dificuldades nos percursos. Em muitos casos, não foi possível prosseguir com as viaturas até os locais de interesse, tendo as equipes realizado deslocamentos a pé. Em razão das chuvas, os trechos possuíam muito barro e lama. Também foi necessária a transposição de rios por meio de balsas.
Avaliação do MPF – O procurador da República Gilberto Batista Naves Filho exalta a eficiência do grupo de fiscalização móvel. Para o membro do MPF, a união de esforços pelos órgãos públicos federais propicia fiscalizações rápidas, técnicas, efetivas e seguras. “Atuando juntas, as forças federais são capazes de transpor qualquer obstáculo e levar os serviços públicos aos mais necessitados, mesmo nas localidades de mais difícil acesso”, ressaltou.
Trabalho constante – O MPF tem realizado esforços constantes para atender a demandas de apuração criminal por supostos crimes contra trabalhadores no campo no Pará. Também em Medicilândia, no início do ano, o MPF, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) e a PF realizaram, operação para investigar possível ocorrência de trabalho escravo em fazenda localizada às margens da rodovia Transamazônica.
A operação foi deflagrada em menos de 24 horas após o MPF ter recebido denúncia sobre o tema. O MPF realizou oitivas em vídeo com todos os presentes na propriedade rural. Quatro trabalhadores que atuavam na aplicação de pesticidas nos pastos estavam com equipamentos inadequados e sem registro. Após manifestação de vontade dos trabalhadores, eles foram retirados do local. E duas pessoas foram presas em flagrante em razão da posse ilegal de armas de fogo no local.
No final de 2022, no mesmo município, o MPF e a PF, com o apoio do Ministério Público do Estado do Pará (MPPA), resgataram dois adultos e uma criança de nove anos supostamente vítimas do crime de submissão a condições semelhantes às de escravos. O resgate ocorreu após uma das vítimas ter ido à delegacia da PF em Altamira para denunciar a situação. Segundo o denunciante, na data da denúncia fazia dois dias que as vítimas estavam sem se alimentar.
Na fazenda, as equipes da PF e do MPF constataram que as condições às quais as vítimas eram submetidas eram péssimas: não havia água potável, nem alimentos, nem banheiro, nem energia elétrica. A água para consumo era retirada de uma cacimba. Segundo o adulto que estava há mais tempo no local – cinco meses –, o contratante prometeu que, além de pagar salário, ia fornecer alimentação. No entanto, a promessa foi cumprida só durante o primeiro mês de trabalho.
Com informações do MPF/PA