Um relatório da Polícia Federal aponta que quatro desembargadores alvos da operação Q.I. – Quem Indica – enviaram por mensagens nomes de ao menos 11 servidores a Parsifal Pontes, então chefe da Casa Civil, para nomeação em cargos no início do mandato de Helder Barbalho (MDB) em 2019.
Depois da Casa Civil, Pontes passou a chefiar a Secretaria Estadual De Desenvolvimento Econômico, Mineração e Energia (Sedeme), quando foi exonerado em outubro de 2020, após ter sido preso pela Polícia Federal durante o “escândalo dos aparelhos respiratórios” na pandemia de Covid-19. O celular dele foi apreendido pela PF.
Na conversa com Pontes, os desembargadores pediam que o governo mantivesse servidores comissionados que tinham sido exonerados na troca de gestão entre Simão Jatene e Helder Barbalho. Entre os apadrinhados pelos membros da Justiça do Pará estão familiares e cônjuges, segundo as investigações.
Todos os servidores indicados foram readmitidos ou mantidos nos cargos pelo atual governo.
Sobre a operação, o Governo do Pará afirmou que “colabora com os órgãos de investigação e confia na justiça” e que “todos os funcionários que são alvo da operação foram contratados entre 1993 e 2015”. O Tribunal de Justiça do Pará não quis se manifestar.
Um dos casos detalhados na decisão da ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nancy Andrighi, autorizando a operação da PF, é a nomeação de Cláudia Vidigal Tavares Nunes, que é esposa do então presidente do Tribunal de Justiça do Pará (TJPA), o desembargador Ricardo Ferreira Nunes.
O STJ aponta que o nome dela está na lista de “apadrinhados” do irmão de Ricardo Nunes, o desembargador Rômulo José Ferreira Nunes – que também incluía outras cinco servidoras, a esposa dele e o irmão.
Segundo a ministra do STJ, ao relatar os oito nomes ao então chefe da Casa Civil, o magistrado dizia em mensagem a Pontes que o caso de Cláudia Vidigal seria tratado por Ricardo Nunes com o “chefe”.
“(…) as nomeações apontadas no citado relatório da Polícia Federal (…) indicam que membros do Poder Judiciário local podem, em tese ter eventual ingerência no funcionamento do aparelho estatal (com aparente loteamento de cargos comissionados)”, entende a ministra.
O g1 solicitou novo posicionamento do governo sobre o apontamento da PF, citado pela ministra, mas ainda não havia obtido resposta.
Segundo lista de admissões enviada pelo governo, a referida servidora atuava em órgão estadual desde abril de 2003. Mas, segundo Parsifal Pontes informou ao desembargador, ela poderia ter sido exonerada “por eventual erro” na troca de gestão.
Cláudia Nunes foi exonerada no dia 7 de janeiro de 2019. A conversa entre Pontes e o desembargador Rômulo Nunes foi no dia seguinte, 8 de janeiro de 2019.
Uma semana após a exoneração, Cláudia Nunes foi agora nomeada a cargo em comissão na Casa Civil no dia 14 de janeiro daquele ano.
Quem são os investigados
Os membros do TJPA envolvidos na investigação são:
- Rômulo José Ferreira Nunes (desembargador)
- Maria de Nazaré Silva Gouveia dos Santos (desembargadora)
- Vânia Lúcia Carvalho da Silveira (desembargadora)
- Ricardo Ferreira Nunes (desembargador e então presidente do TJPA)
Os servidores apontados como “apadrinhados” na investigação são:
- Márcia Cristina Wanzeler Lemos (servidora) – exonerada em 03/01/2019 e readmitida em 10/01/2019
- Maria de Lourdes Maués Ramos (servidora) – exonerada 03/01/2019 e nomeada 07/01/2019
- Regina Coeli Franco da Rocha (servidora) – exonerada no dia 03/01/2019 e nomeada 10/01/2019, com efeitos a partir de 07/01/2019
- Kátia Andrade da Silva (servidora) – exonerada 03/01/2019 e nomeada 08/04/2019, com efeito a partir de 01/04/2019
- Maria do Perpétuo Socorro Nunes Botelho (servidora) – nomeada em 12/02/2019
- Lindalva Gonçalves de Araújo Nunes (esposa do desembargador Rômulo José Nunes) – ocupava cargo em janeiro de 2019
- Rômulo Marcelo Ferreira Nunes (irmão do desembargador Rômulo José Nunes) – ocupava cargo em 2019
- Cláudia Vidigal Tavares Nunes (esposa do desembargador Ricardo Nunes) – exonerada em 07/01/2019 e renomeada em 14/01/2019
- José Deorilo Cruz Gouveia dos Santos (marido da desembargadora Maria de Nazaré dos Santos) – nomeado em 27/02/2019
- Jessica Ferreira Teixeira (servidora) – nomeada em 08/01/2019
- Roberta Silveira Azevedo Xavier (filha da desembargadora Vânia Lúcia Carvalho da Silveira) – nomeada em 07/02/2019
Sobre a operação
A Polícia Federal cumpriu, nesta quinta-feira (4), 30 mandados de busca e apreensão contra desembargadores do TJPA e servidores do Governo do Pará para investigar a contratação de profissionais por meio de indicações.
Em um dos celulares apreendidos, que estava com o ex-Chefe da Casa Civil, Parsifal Pontes, foram identificadas mensagens que, segundo a Polícia Federal, mostraram “desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, valendo-se de seus cargos, patrocinaram, em tese, direta e indiretamente, interesses privados perante a Administração Pública, ao indicar “apadrinhados” (parentes e amigos) para cargos em comissão em diversos órgãos do Poder Executivo do Estado do Pará”.
Ainda segundo a PF, foram encontrados indícios, no mesmo celular, de que Parsifal Pontes, em conjunto juntamente com membros da cúpula do Governo “praticaram atos de ofício contra disposição expressa de lei para satisfazer interesses pessoais, nomeando e/ou mantendo “apadrinhados” indicados por Desembargadores do Tribunal de Justiça do Estado do Pará para cargos em comissão no Poder Executivo do Estado do Pará”.
PF do Pará realiza busca e apreensão contra desembargadores do TJPA. — Foto: Reprodução / Ascom PF
Servidores de órgãos do Poder Executivo estadual também foram alvo da Operação Q.I. – Quem Indica – que recebeu esse nome em alusão à sigla informal “Quem Indica” , usada popularmente em referência às indicações de trabalho baseadas nas relações interpessoais e de amizade, não levando em consideração as habilidades e conhecimentos formais dos candidatos a uma vaga de trabalho.
A investigação iniciou em 2020 com a análise do material apreendido na Operação “Para Bellum”, que apurou fraudes na compra de respiradores pelo Governo do Pará, durante a pandemia de Covid-19.
A PF informou que segue investigando os fatos.
Fonte: G1 Pará