Quando precisou levar a sobrinha para receber atendimento de alta complexidade em Marabá, no Sudeste do Estado, o líder da etnia Gavião que mora com a família em Bom Jesus do Tocantins, cidade vizinha, Ubirajara Trompé, precisou encarar a fila, a espera, a burocracia e a falta de sensibilidade comum a todas as pessoas que recorrem ao Sistema Único de Saúde (Sus). A garota de 12 anos levou três anos para ser operada, não necessariamente por ser indígena, claro.
Ubirajara acredita, no entanto, que a eliminação de alguns entraves próprios aos povos indígenas na hora do acesso ao atendimento de média e alta complexidade poderia, sim, ter reduzido o tempo na fila de espera. “Temos costumes diferentes de repouso, alimentação e vestimenta. Moramos longe dos centros urbanos, normalmente em áreas de difícil acesso. Sem falar que os hábitos para recuperação de procedimentos cirúrgicos nem sempre favorecem quem mora em aldeia”, explicou.
Para resolver o entrave, o Governo do Estado pretende criar ferramentas de auxílio para que esses povos tenham acesso com mais facilidade a tratamentos de alta e média complexidade. Um Projeto de Lei de indicativo propõe a presença de intérpretes em hospitais, deslocamento entre aldeias e a unidades, adequação alimentar e o isolamento de pacientes quando estes vierem de povos de contato recente com o ‘homem branco’. O Projeto, de autoria do deputado estadual Dr. Jaques Neves, que além de médico é presidente da Comissão de Saúde da Assembleia Legislativa do Estado (Alepa), ainda depende de aprovação no plenário da Casa.
Na semana em que o governo do Estado transferiu a sede para Marabá, no início de abril, Ubirajara Trompé e representantes indígenas das etnias Gavião e Kaipó das cidades de Ourilândia do Norte, Tucumã, Redenção e Conceição do Araguaia esperaram por mais de 12 horas por uma audiência com o governador Helder Barbalho. A facilitação do acesso à saúde em casos específicos foi um dos temas tratados na pauta. O atendimento básico, que ano passado cogitou-se transferir para os municípios, permaneceu sob responsabilidade do Governo Federal a pedido das próprias lideranças indígenas.
“É importante entender que esse gargalo, caraterizado pelo acesso dos indígenas a tratamentos de média e alta complexidade, é um problema nacional, e não exclusivamente do Pará. Ainda assim, temos toda boa intenção de facilitar esse acesso. Não se trata de furar a fila, mas de eliminar entraves que geram conflito entre a cultura dos povos indígenas e a convivência em grandes centros urbanos”, explicou Alberto Beltrame, titular da Secretaria de Estado de Saúde (Sespa). O Projeto de Lei também prevê a viabilidade de exames especializados para a realização de cirurgias e diagnósticos mais precisos, via Sus.
Como resultado da reunião em Marabá, o governo do Estado cogita, por meio da Casa Civil, criar duas coordenadorias específicas para atender demandas relacionadas aos povos quilombolas e às etnias indígenas. Paralelo a isso, um grupo de trabalho foi criado para analisar 21 demandas apresentadas pelos indígenas. A Fundação Nacional do Índio (Funai), responsável pelo cuidado desses povos em todo o país, também foi convidada para integrar o grupo. De acordo com a Federação dos Povos Indígenas do Pará, o Estado conta atualmente com 77 etnias divididas em 55 cidades do território paraense.
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