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Ação do MPF pede suspensão de instituições que compram ouro ilegal extraído em terras indígenas no PA

Três instituições financeiras teriam comercializado mais de 4,3 mil KG de ouro ilegal entre 2019 e 2020, segundo a ação. Procuradoria pede condenação à multa de R$ 10,6 bilhões por danos sociais e ambientais.

Operação identifica garimpos ilegais dentro de terra indígena no Pará. — Foto: Reprodução / PF
Operação identifica garimpos ilegais dentro de terra indígena no Pará. — Foto: Reprodução / PF
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Ação judicial do Ministério Público Federal (MPF) pede a suspensão das atividades de três instituições financeiras acusadas de comercializar, no mercado nacional e internacional, mais de 4,3 mil quilos de ouro ilegal nos anos de 2019 e 2020. Segundo o MPF, o ouro é extraído de garimpos ilegais nos municípios de Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso, região sudoeste do Pará.

O minério foi comercializado por empresas chamadas de Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários (DTVM), identificadas como ‘FD’Gold’, ‘Carol’ e ‘Ouro Minas’, que, segundo o MPF, seriam as principais compradoras de ouro ilegal na região. O MPF pede, ainda, que as empresas sejam condenadas à pena de R$ 10,6 bilhões por danos sociais e ambientais.

Segundo o MPF, os processos judiciais buscam a adoção de medidas preventivas para interromper o ciclo de ilegalidade, através da implantação de mecanismos eficientes de compliance – padrões empresariais para cumprimento da legislação. O MPF pede à Justiça que as instituições só tenham as atividades liberadas na região se comprovarem mecanismos para evitar que o minério seja extraído de terras indígenas e unidades de conservação de proteção.

A ação do MPF foi citada em reportagem do Fantástico, exibida no domingo (29). Em nota, a Ouro Minas havia declarado que não teve acesso aos autos da ação proposta pela justiça. A FD Gold disse que “desconhece o teor da ação e o objeto do processo”. Já a DTVM Carol não havia se posicionado sobre a ação. O G1 tentava contato com as empresas nesta segunda, mas ainda não havia obtido novo posicionamento até a última atualização da reportagem.

Fraudes

A comprovação de fraude na compra do ouro em entre 2019 e 2020 em Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso veio após análise de imagens de satélite. As três empresas declararam, no período indicado, a compra de ouro tinha origem de lavra garimpeira regular. Mas, segundo o MPF, imagens de satélite mostraram que nenhuma das áreas declaradas pelas instituições tinha qualquer sinal de exploração.

O MPF conclui, então, que se o minério comercializado não veio de áreas legalizadas, que permanecem intactas, a origem, provavelmente, seria dos muitos garimpos ilegais que se proliferam nos três municípios. Nos trâmites judiciais, agora cabe às instituições financeiras comprovarem que não compraram ouro de forma ilegal.

As investigações apontam que, no período de 2019 a 2020, a empresa ‘Ouro Minas’ declarou ao governo federal ter comprado 1.080 quilos de ouro, extraídos de 127 áreas em que a exploração de ouro era permitida. Já a ‘FD’Gold’ declarou a compra de 1.370 quilos de ouro, supostamente originados em 37 áreas de lavra garimpeira regular. A terceira empresa, a ‘Carol’ declarou 1.918 quilos de ouro comprados de 56 áreas de lavra.

Investigações

As ações judiciais resultam de investigações feitas pelo MPF e de levantamento científico feito em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Um levantamento, denominado “Legalidade da produção de ouro no Brasil”, com base nos dados públicos sobre a produção mineral brasileira, constatou o predomínio da ilegalidade na cadeia do ouro.

Segundo o MPF, da produção de 30,4 toneladas de ouro no Pará, no período de 2019 a 2020, ao menos 17,7 toneladas (58,4%) foram extraídas com falsa indicação de origem, seja pelas evidências de extrapolação dos limites autorizados para a lavra pela Agência Nacional De Mineração (ANM), seja pela indicação de áreas de floresta intacta ou sem título de lavra vigente como origem do ouro.

O relatório contém informações prestadas pelas empresas no pagamento da Contribuição Financeira por Exploração Mineral (Cfem), de registros de Permissões de Lavras Garimpeiras (PLGs) da Agência Nacional de Mineração (ANM) e de imagens de monitoramento da floresta amazônica, cedidas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).

Atividade predatória

As ações judiciais apontam que as fraudes cometidas na comercialização de ouro alimentam, no sudoeste do Pará, a permanência e a proliferação de vastas áreas de garimpos ilegais, onde há forte atuação do crime organizado e relação direta com a destruição de áreas protegidas, principalmente nas terras indígenas Munduruku e Sai-Cinza, que ficam na região onde o levantamento foi realizado.

O MPF considera a situação socioambiental nos municípios de Itaituba, Jacareacanga e Novo Progresso como “desesperadora”.

“As notícias de ataques a indígenas da parte de garimpeiros, do crescimento do garimpo nessas áreas e da violência que o conflito vem assumindo são públicas e notórias. As medidas para contenção imediata dessa gravíssima situação são multidimensionais, e implicam, para além da adoção de mecanismos estatais repressivos, também o sufocamento dos mecanismos de incorporação do ouro ilegal ao mercado lícito”, sustenta o MPF.

Cadeia de comercialização do ouro

O ouro extraído nos garimpos é injetado no mercado por meio de instituições financeiras chamadas de DTVM, as Distribuidoras de Títulos e Valores Mobiliários.

A cadeia ilícita começa com a exploração da matéria-prima, que é repassada aos intermediários e alcança a exportação, com destino às grandes joalherias do mercado nacional e internacional. As empresas que compram o ouro podem declarar que a matéria-prima tem origem legal, mas a informação não é checada e nem passa por controle específico.

De acordo com dados do Instituto Escolhas, mostrados na reportagem do Fantástico, o Brasil registrou, oficialmente, em 2020, a produção de 92 toneladas de ouro. No entanto, o país apresentou exportação de 11 toneladas do minério. Ou seja, mais de 19 toneladas de ouro saíram do país de forma ilegal. Os principais importadores desse produto são os mercados do Canadá, Suíça, Bélgica e Reino Unido.

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